Em 1 Co 4.5 Paulo instruiu os coríntios dizendo, “nada julgueis antes de tempo”. Contudo na passagem de 1 Co 5.1-13, Paulo é contundentemente crítico em relação à igreja por falhar em julgar um irmão imoral. Paulo não está sendo incoerente. Um estudo das passagens sobre “julgar” nos ajuda a fazer distinções importantes. Em geral não devemos “julgar” no sentido de condenar os outros. Mas devemos “julgar” no sentido de avaliar.
Em nossos relacionamentos a faceta condenatória de julgar não se trata apenas de taxação de opinião sobre situações ou pessoas. Existem fatores que corroboram para a formação correta ou incorreta de nossas avaliações. As causas são tão terríveis quanto as expressões e atos desequilibrados de condenação e excomungações que proferimos por meio de nossas decisões carregadas de parcialidades. Julgamentos infundados estão alicerçados sobre sentimentos ou ressentimentos, valores e expectativas egoístas. Indiscutivelmente há pessoas que julgam por inveja; que criticam por ciúmes e que condenam por maldade e neste caso, julgar não será apenas uma questão de imaturidade, inconveniência, precipitação ou desconhecimento de fatos – será a confirmação de uma personalidade não transformada pelo Evangelho de Cristo.
O que temos visto é a exibição de uma religiosidade sem o amor de Cristo e essa desenvolveu uma equívoca santificação de combate (um fundamentalismo que se posiciona contra pecador e não contra o pecado). Percebemos um arrogante entendimento espiritual que despreza o desígnio da humildade e entendimento cristãos e que forja uma verdade excludente e temerária quando exemplifica uma posição invasiva e implacável de juizado sobre causas e questões alheias.
Por tantos disparates em nome de Deus, faz-se necessária uma meditação equilibrada sobre o que nos propõe as Escrituras a respeito do tema “julgar”. Por tal razão, convido-o a uma reflexão sobre a forma de nos comportarmos neste particular com base em textos bíblicos.
É pertinente ao artigo fazer distinções entre aquilo que os cristãos não devem tentar avaliar, e aquelas áreas nas quais a avaliação é importante.
O QUE NÃO DEVEMOS JULGAR
1. Não temos direito de condenar os outros, antes, devemos perdoar (Mt 7.1,2; Lc 6.37-38).
2. Não devemos julgar a fidelidade do outro crente, em se tratando de seu chamado no Senhor (1 Co 4.3-5).
3. Não devemos nos relacionar com os não-cristãos como se fôssemos seus juízes. Sua moralidade ou imoralidade não é a questão. A única questão é que eles precisam conhecer a Cristo (1 Co 5.12).
4. Não devemos usar condenação ou crítica na tentativa de forçar os outros a se conformarem à nossa consciência (Cl 2.16).
5. Não devemos falar contra, ou “caluniar”, nossos irmãos. Quando o fazemos, exaltamos a nós mesmos como juízes em vez de cumpridores da Lei. Somente Deus, que deu a Lei, pode condenar (Tg 4.11,12).
Em cada uma destas passagens acima, “julgar” tem uma força quase legal. A pessoa que julga põe em dúvida os motivos ou escolhas dos outros, e então os condena. Contudo, cada elemento deste processo é excluído, antes de tudo pelo fato de que meros seres humanos não são competentes para avaliar os motivos dos outros ou as práticas “duvidosas”. Mesmo quando uma ação é claramente errada, nosso papel não é condenar, mas perdoar e procurar restaurar. Atitudes de julgamento e tentativas de punir ou simplesmente condenar, não são apropriadas a comunidade cristã.
O QUE DEVEMOS JULGAR
1. Os seres humanos devem julgar a violação da lei criminal e civil. Deus estabeleceu o governo humano para coibir os que praticam o mal (Rm 13.1-7).
2. Devemos fazer “julgamentos sobre todas as coisas”. Aqui “julgar”, significa exercer discernimento, examinar. Por termos a Palavra e o Espírito Santo podemos enxergar as questões da vida sob a perspectiva de Deus (1 Co 5.12,13).
3. A igreja deve julgar o irmão ou irmã que persistem na prática da imoralidade ou de outro pecado (1 Co 5.12, 13).
4. Os crentes devem servir em grupos de julgamentos estabelecidos para resolver disputas entre cristãos (1 Co 6.2-5).
5. “Julgai vós mesmos” em questões claramente estabelecidas pelas Escrituras, e também com a finalidade de desenvolver convicções baseadas em princípios estabelecidos na Palavra de Deus (1 Co 10.15; 11.13).
A consciência do ensino do NT sobre o julgamento fornece uma base significativa ao abordarmos a questão da disciplina na igreja, e da necessidade que esta disciplina impõe sobre nós quanto a julgar as ações de um irmão ou irmã no Senhor.
O proposto realça a necessidade de equilíbrio bíblico para elaborarmos nossas avaliações. Julgar não é pecado desde que esteja em conformidade com a Palavra e nas permissões do amadurecido senso cristão. Infelizmente muitos são os que julgam o tempo e as estações por meio de escatologias próprias; há os que julgam de forma generalizada a igreja por conta de suas experiências ruins e isso não retrata a verdade maior. Ainda há os que julgam a espiritualidade e a integridade cristã dos outros na maioria das vezes sem razão e necessidade. Julgamentos infundados na igreja e no mundo cristão é o que não falta para tristeza nossa entre os crentes.
Que o Espírito de Cristo esclareça nosso entendimento, traga equilíbrio aos nossos ânimos afim de que com amor e sabedoria possamos nos conduzir coerentemente com o Evangelho de retidão que pregamos.