@Por Rubens Teixeira
A Constituição da República prescreve no artigo 22, inciso I, que é competência privativa da União legislar sobre direito penal. Isso quer dizer que nem os estados, nem os municípios podem legislar sobre este tema. Menos ainda poderiam os entes privados, especialmente as igrejas.
Por outro lado, há outro conceito proposto pelo jurista alemão do século passado Hans Kelsen, muito aplicado à teoria do direito brasileiro, que é a hierarquia das normas. No Brasil, as normas estão dispostas de forma decrescente da seguinte maneira: Constituição Federal; leis complementares, ordinárias, delegadas; medidas provisórias; decretos legislativos e resoluções; decretos regulamentares e outras de menor extensão e eficácia.
Isso quer dizer que, se o PLC122 for aprovado, mesmo se por uma aberração, um estado ou município que aprovasse uma lei contrariando o seu conteúdo, ou surgisse outra, de hierarquia inferior, com teor contrário, não teria eficácia. Não só porque é competência privativa da União legislar sobre direito penal, mas também por conta da hierarquia que existe entre as normas.
Além disso, o cartório onde se vai registrar o estatuto das igrejas verifica o alinhamento com a legislação vigente. Se aprovado com cláusula ilegal, o cartório pode responder para a corregedoria que o fiscaliza. Um estatuto que tente legitimar qualquer coisa vedada na lei terá o dispositivo contrário a ela nulo, ou, se todo ele contrariar a norma legal, será totalmente nulo.
Se há um estatuto aprovado e surge uma lei nova que vede algo previsto nele, vale a lei e a cláusula estatutária anteriormente vigente não servirá de argumento de defesa para quem descumprir o mandamento legal. Se não queremos uma lei, temos que batalhar por isso antes que seja aprovada. Juridicamente, a lei tem eficácia erga omnes (contra todos) e não há estatuto ou contrato social que pode nos livrar dos seus efeitos.
Fui conferir, no site do Senado Federal, as modificações implementadas no “novo PLC122” e cheguei à conclusão de que ainda há flancos. Todos os artigos modificados de todas as leis alteradas no PLC 122 sofrem do mesmo mal apontado abaixo. Resolvi comentar apenas o primeiro artigo do projeto de lei porque os comentários se aplicam a todos os demais.
“Art. 1º A ementa da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, passa a vigorar com a seguinte redação: “Define e pune os crimes de ódio e intolerância resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião, origem, gênero, sexo, orientação sexual, identidade de gênero ou condição de pessoa idosa ou com deficiência. (NR)”. Claro que, depois de distinguir alguns preconceitos de forma clara, não faz o menor sentido enquadrar outros, não elencados, na palavra ‘origem’, como se fosse um pacote aberto que coubesse qualquer coisa. Se outros caberiam neste pacote, qualquer um caberia. Não precisaria dos elencados neste PLC tão empurrado para a aprovação. Como o maior preconceito no Brasil, muito distante dos demais, é o contra a pobreza e não foi contemplado, não faz sentido falar nestes outros.
A pobreza mata, exclui, produz efeitos, por razões terríveis, que leva as pessoas a morrerem nos corredores de hospitais, a não terem escolas para seus filhos, faz com que o Estado seja mais violento com o pobre do que com o rico, tolera que os cidadãos ricos tratem os pobres com desprezo, impunemente, que nas regiões carentes não haja transporte digno, enquanto nas ricas haja estrutura sofisticada e sempre aprimorada etc.
Pobres, na prática, em muitos casos, não entram na conta da defesa dos Direitos Humanos, ou, pelo menos, não têm o mesmo peso que os mais abastados. Basta ver, por exemplo, que a OAB diz que há advogados demais no mercado, enquanto os que mais têm direitos violados são pobres por falta de advogados que os assistam, enquanto as defensorias públicas vivem sobrecarregadas e não dão conta de atender aos carentes da forma que precisam.
Por isso e por muitas outras razões que já exteriorizei em outros artigos e vídeos, o PLC122 é hipócrita e perigoso sim para os cristãos, mesmo depois da reformulação que apresentaram que, evidentemente, tornou mais tênue, mas não eliminou os riscos de punições a cristãos que defendem a família tradicional. Se aprovado, até defendermos o que formos contrários em seu texto, poderá ser interpretado como crime de apologia de crime ou criminoso, previsto no artigo 287 do Código Penal. Para fugirmos dos riscos da falta de informação e da má fé de quem quer que seja, precisamos estar atentos.
* @RubensTeixeira é Bacharel em Direito (UFRJ – aprovado para a OAB/RJ), membro dos Juristas de Cristo, doutor em Economia (UFF), mestre em Engenharia Nuclear (IME), pós-graduado em auditoria e perícia contábil (UNESA), engenheiro de fortificação e construção (IME), bacharel em Ciências Militares (AMAN), professor, escritor, radialista, Membro Titular da Academia Evangélica de Letras do Brasil, ocupante da cadeira 37, e da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra e graduado do Haggai Institute Advanced Leadership Training.