Por Johnny Bernardo
Depois de alguns dias sem publicar nada por aqui (a última publicação foi um texto sobre o secularismo extremista e o uso do Burkini), voltamos para fazer uma breve análise de uma pesquisa conduzida por um grupo de pesquisadores das universidades USP e Unifesp sobre o perfil político do paulistano. Para desenvolver o perfil foram ouvidas 1.058 pessoas de todas as faixas etárias, gêneros e regiões da cidade de São Paulo, durante os últimos 3 anos.
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Dentre vários temas abordados pelos pesquisadores, um merece atenção: punitivismo e evangélicos. Perguntados sobre se é correto punir os criminosos com mais tempo de cadeia, 73,8% dos entrevistados disseram acreditar que a medida é correta. A opinião é compartilhada por 87,9% das pessoas que se dizem “muito conservadoras”, 76,4% das que se dizem “pouco conservadoras”, e 46,2% das que “não se consideram conservadoras”, segundo reportagem publicada pelo El País.
O posicionamento favorável ao punitivismo (e há grupos que chegam ao absurdo de defender práticas de tortura adotadas pelo regime militar brasileiro, linchamento público e pena de morte), vai de encontro ao que boa parte da população defende. É algo natural, mas há vários problemas que a grande massa não consegue detectar sem uma lente ajustada e um distanciamento necessário para uma compreensão correta do objeto.
É parte do que chamamos em Ciências Sociais de “senso comum”. Há uma grande diferença entre o que um cidadão comum pensa sobre determinado aspecto social, e o que um cientista concebe a partir de uma série de experiências e análises. A problemática da violência, da criminalidade e as formas de punição adotadas no Brasil envolvem uma série de outras questões, como pobreza, costumes, alienação não perceptíveis pela sociedade.
Em outras palavras, é preciso certo distanciamento e conhecimento para que se chegue a uma compreensão da problemática da criminalidade e de que maneira reduzi-la. O que se sabe de pesquisas conduzidas por especialistas é a que o modelo punitivista adotado por países como EUA, Rússia, China e Brasil não funciona a médio e a longo prazo. Além do mais, nestes países (que ocupam as quatro primeiras colocações no número de presos) há uma série de problemas sociais, como desemprego, pobreza e cerceamento ideológico.
A conclusão geral é a de que a situação social destes países conduzem a uma degeneração social não resolvida pelo sistema penitenciário. É claro que a pobreza não é uma desculpa para que jovens se envolvam com crimes, mas acaba influenciando e conduzindo indiretamente. Basta ver o perfil dos presos no Brasil e nos EUA: são, em sua maioria, negros e de famílias em situação de pobreza. Portanto, há um fator a ser considerado.
Mais tempo na cadeia não é a solução para a diminuição da criminalidade. Há que se desenvolver uma reforma do código penal brasileiro, e um ataque há outras problemáticas sociais como o desemprego, a subnutrição, a alienação social. Tem-se que, ao mesmo tempo, investir em educação e conduzir uma profunda reforma cultural no Brasil para que cheguemos ao patamar cultural de países como Suécia, Noruega, Finlândia e Holanda.
Nestes países a criminalidade é baixa em grande parte devido à política do Estado de bem-estar social, a um profundo investimento em educação e a códigos criminais modernos. Recente reportagem publicada pelo jornal BBC Brasil revelou: Holanda enfrenta ‘crise penitenciária’: sobram celas, faltam condenados. Somente nos últimos anos 19 prisões foram fechadas e outras estão em processo de fechamento. O mesmo acontece na Suécia, que em 2013 fechou quatro penitenciárias e um centro de detenção. Qual é o segredo?
Por que países que investem pesado em políticas públicas e conduzem uma profunda reforma penal vêem o número de crimes e presos cair enquanto países como EUA e Brasil vivem o oposto, com um crescente número de pessoas presas devido o envolvimento com alguma prática criminosa? É surpreendente o fato de que boa parte dos presos nestes dois países foram encarcerados devido algum tipo de envolvimento com o tráfico de drogas.
Menos presos e menos tempo de detenção significa menos gasto com a manutenção do sistema carcerário. Resultado: sobra mais dinheiro para investimento em outras áreas, como saúde e educação. É uma questão de lógica, de sustentabilidade do sistema. Apesar de não termos dados confiáveis sobre o custeio do sistema penitenciário brasileiro (apenas três estados enviam informações referentes ao custeio de suas detenções), sabe-se que gasta-se mais com a manutenção do sistema penitenciário do que com educação. Um erro.
Uma possível modernização do código penal brasileiro terá que passar por um novo entendimento do tráfico de drogas (compensa, por exemplo, continuar com a política de combate ao tráfico, direcionar recursos públicos para um problema que deveria ser visto como de saúde pública e não policial?), que tipo de crimes devem resultar em encarceramento, como diferenciar crimes hediondos e os demais crimes? Deve-se refletir.
Concluímos com a ideia de que o apoio evangélico ao punitivismo é um erro, e por dois motivos: (1) não é uma política com resultados positivos a médio e longo prazos; (2) é uma contradição com alguns posicionamentos progressistas de Jesus, que protegeu uma adúltera ao ser ameaçada de apedrejamento, e restabeleceu uma nova análise da Lei de Talião (veja, por exemplo, seu posicionamento sobre o “olho por olho” e o “dente por dente”). Jesus é um modelo progressista a ser seguido por seus discípulos e o mundo.
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