Embora inédita, a eleição do cardeal e também jesuíta, Jorge Mario Bergoglio, agora Francisco, teve como base critérios políticos e estratégicos. Políticos porque ocorre em um momento em que a América Latina perde a figura do ex-presidente venezuelano, Hugo Chávez, e da disputa da Argentina pelas ilhas Malvinas – hoje possessão do Reino Unido. O suposto envolvimento de Bergoglio – segundo revelações do jornalista Horacio Verbitsky, em seu livro “El Silencio”, publicado em 2005 – com a ditadura argentina, entre as décadas de 70 e 80, e as constantes críticas ao kirchnerismo dão margem a questionamentos.
A delicada relação entre a Argentina e o Vaticano teve um episódio central em junho de 2008 quando o primeiro ministro do papa Bento XVI, Tarcísio Bertoni, realizou uma reunião de 40 minutos, em Roma, com a presidenta Cristina Kirchner, ocasião em que foi tratado o pedido de criação de uma nova diocese de Tierra Del Fuego, que não incluiria as ilhas Malvinas. O pedido, visto pelo governo argentino como uma tentativa do Vaticano de retirar a Igreja Católica Malvina da jurisdição da província austral da Argentina, foi abandonado após a visita de Kirchner ao Vaticano.
Estratégicos porque havia a necessidade da eleição de um papa não europeu como forma de contraposição ao eurocentrismo decadente dos últimos 493 anos – neste período apenas papas de origem europeia comandaram a Igreja. A Argentina, por suas características culturais e de organização semelhantes à de países europeus, seria uma opção aceitável para a escolha de um cardeal latino-americano. As raízes italianas de Bergoglio e sua relação com cardeais brasileiros e lideranças do Vaticano também foram levadas em consideração no conclave.
Finalmente, a partir de um cardeal argentino a Igreja poderia exercer maior influência sobre outros países da América do Sul, dentre os quais o Brasil onde a perda de fieis para igrejas evangélicas cresce em um ritmo crescente e que, portanto, passou a ser motivo de preocupação por parte da Cúria Romana. Dessa forma, a Igreja conseguiu “solucionar” três entraves: a da necessidade de um papa extraeuropeu, a busca por uma figura próxima aos ideais conservadores e o começo da contenção da debandada de fieis para outras religiões, dentre as quais as igrejas evangélicas.