Os evangélicos ganham cada vez mais espaço na mídia secular. A guinada se deve ao crescimento numérico (dados do IBGE apontam para 42,5 milhões) e midiático do movimento evangélico nacional. Mudanças na direção das Organizações Globo (particularmente após o falecimento do jornalista Roberto Marinho, em 6/8/2003, e a divulgação do novo mapa religioso brasileiro, em 2010) contribuíram de forma decisiva para a abertura dos meios de comunicação da Família Marinho aos evangélicos.
É uma decisão comercial, obviamente, mas que traz como consequência a ampliação do leque midiático, aproximando outros órgãos da imprensa com a massa consumidora evangélica. Ao mesmo tempo tem diminuído os estereótipos, as caricaturas preconceituosas outrora presentes em minisséries e novelas da Rede Globo. Os tempos são outros, felizmente. Encenação de cultos em Amor à Vida, abertura do SBT para participação de cantores e lideres evangélicos em programas como de Raul Gil, é um avanço no sentido de que os estereótipos discriminatórios foram superados.
Ainda há alguns resquícios do passado em impressos como a revista IstoÉ, mas tal se deve à problemática neopentecostal, particularmente em torno da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) e da Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD). A edição deste domingo (5) da Folha de São Paulo também traz alguns resquícios. Na edição, quatro referências – feitas por Hélio Schwartsmam, Fabiano Maisonnave, Bernardo Mello Franco e do Editorial SP – põe os evangélicos em relevo.
Na primeira, Schwartsmam menciona o lançamento do livro “Caught in The Pulpit: Leaving Belief Behind” (Capturados no púlpito: deixando a crença para trás), em que os autores Dennett e Linda LaScola fazem relatos de pastores, padres, rabinos e outras lideranças religiosas que se veem em um dilema existencial: “manter a integridade intelectual, o que implicaria renunciar a seus postos, ou ir torcendo as palavras e suas próprias crenças, para continuar exercendo suas funções e, assim, preservar casamentos, amizades, posição social e aposentadorias” (Folha de SP, A2).
Acompanhando a polêmica em torno da terra indígena Tenharim, Maisonnnave destaca que os 900 tenharim não têm pajés e são de maioria evangélica – além de torcedores do Corinthians e do Flamengo. “Moram em casas de madeira com eletricidade. Quase todas as famílias são bilíngues, têm TV e moto, e duas aldeias estão conectadas à internet” (A5). O retrato descreve uma comunidade indígena menos isolada em relação a outras do interior da selva amazônica, e, ao mesmo tempo, descreve parte da presença evangélica em áreas indígenas – atualmente limitada, segundo agências missionárias com especialização em povos não alcançados.
De forma um pouco mais polêmica, Mello Franco destaca: “Garotinho cadastra eleitores evangélicos e distribui kits”. Do Rio, onde recebeu gratuitamente um dos kits de Garotinho – que inclui um livro, camiseta e carteirinha personalizada com a foto do ex-governador -, Mello Franco deixa em relevo que a intenção é “se fortalecer no eleitorado evangélico do Rio”. Estado com o menor porcentual de católicos do país (45,8%), o Rio vive uma batalha pela preferência dos evangélicos, que somam cerca de um terço do eleitorado. “Eles são a principal aposta do deputado para voltar ao poder” (A6), conclui o repórter da Folha. No editorial de São Paulo, “TV Folha traz as melhores entrevistas do ano, uma das entrevistas chama a atenção”: “o padre Marcelo Rossi diz que é contra a candidatura política de padres e pastores” (A7), acrescenta ao debate.
Apesar de alguns resquícios de oposição ou discriminação a alguns lideres ou segmentos evangélicos, de forma geral o relacionamento da mídia com os evangélicos tem melhorado nos últimos anos, como demonstra a aproximação das Organizações Globo com o universo evangélico brasileiro – um fato, por si só, de grande impacto. A presença de um ombudsman no editorial da Folha de São Paulo e em outros órgãos da imprensa também representa um avanço porque permite mediar conflitos – como a recente polêmica envolvendo duas matérias que renderam uma reprovação de Suzana Singer, ombudsman que responde pela análise dos conteúdos da Folha.