Ser cantor gospel no Brasil tornou-se o sonho de muito crente. Gente que do meio da igreja luta para gravar seu primeiro CD, emplacar algum sucesso para lotar a agenda, pegar a estrada e fazer carreira musical entre os evangélicos. O ideal parece coerente, pena que no universo da música gospel tal sentimento tornou-se inocente. Na realidade o objetivo de desenvolver um “ministério de louvor” para abençoar vidas por meio da música tão logo vai se perder e se comprometer com as aspirações comerciais e reais dessas gravadoras cujo foco principal é o de ganhar muito dinheiro!
Foi-se o tempo em que nossos cantores cultivando o humilde espírito cristão gravavam seus trabalhos em pequenas e boas gravadoras de irmãos da fé. Todos os músicos e back vocal serviam a Deus e se entregavam na criação de álbuns que em regra geral eram bons, baratos e vendidos em igrejas e livrarias evangélicas. O tempo passou e a expertise musical quis profissionalizar os cantores, ampliar o aparato das gravadoras, refinar e direcionar as composições, o que por fim teve que esvaziar-se de espiritualidade e enveredar-se pelo caminho sem volta do comércio gospel. Feito isso, nosso louvor tornou-se em ritz, nossa adoração foi sendo remixada e banalizada e hoje são tocadas para desfiles de mulheres semi nuas em campeonatos de musculação, são pedidas por jogadores em gols da rodada, são tocadas como apelo emotivo no fim de palestras de motivação e para nossa tristeza – e não para nossa alegria, o novo cenário da música gospel no Brasil mostra-se secular e puramente comercial.
Nesse mercado fonográfico gospel o ritmo frenético é o das vendas. As letras das músicas misturam-se com cifrões em notas de valor elevado; caixas de CDs empilhados para sair das distribuidoras representam milhões; convites são sinônimos de entrada de receitas em forma de ofertas disfarçadas para gabar-se que não louva por cobrança de cachê. Se vende muito no atacado, no varejo, com promoção e queima de estoque e compra parcelada no cartão. É um mercado consolidado e promissor que supera muitas aéreas de crescimento econômico em nosso país. As gravadoras seculares descobriram que arrebanhar cantores evangélicos é um excelente negócio; afinal os últimos levantamentos comerciais do meio revelaram que em vendas fonográficas a música gospel só perde no momento para cantores sertanejos de tanto que se popularizou. Fizeram de nossos cantores artistas, de nossos louvores negócio e quem sustenta e paga essa banca somos nós.
Alguns cantores evangélicos no Brasil tornaram-se estrelas e firmaram-se entre uma constelação de gente rica e famosa. Frequentam programas de TV, estampam capas de revistas de grande circulação, ganharam marcas e grifes, inspiraram filmes e abriram caminho para quem vislumbra ostentar tal posição. No mundo dos negócios e da fortuna a fama tem seu preço e assim a liberdade para compor louvores de adoração e edificação foi isolada numa cadeia de ganâncias quando tais cantores assinaram seus contratados de riqueza à custa dos seguidores do Evangelho de Cristo.
Esses astros evangélicos não conseguem frequentar os cultos da própria igreja em que congregam por que a agenda não os permite; não atendem a qualquer pedido a menos que o cachê seja compatível com o status elevado de sua avultada fama. Dependendo da gravadora com a qual tem contrato precisam seguir à risca as exigências comerciais que permeiam o acordo. Outra verdade é que a liberdade para compor o repertório está subordinada as diretrizes de mercado, a tendências, a nichos e por aí vai. Canta-se o que vender mais CDs e DVDs e não o que agrada a Deus e edifica os crentes!
Não quero desanimar os aspirantes a estamparem seus nomes no mundo da música gospel, mas o alerto para uma realidade aterradora – você correrá o grande risco de ficar escravo de um sistema comercial pseudo cristão que rouba espiritualidade e absorve tudo por sua necessidade material de grana, fama e glamour. É um ambiente comercial que monetiza a fé, que fatura por cantar sentimentos e esperanças cristãs com rosto de ovelha e voz de dragão (espírito) – igual ao da besta apocalíptica que subiu da terra (Apocalipse 13).
Cobram cachês astronômicos que variam de R$ 10.000,00 a R$ 250.000,00 e ainda tem a hipocrisia de dizerem que estão servindo a Deus com seus ministérios; conversa fiada! Não é incorreto cobrar despesas de locomoção, alimentação, hospedagem e até um valor adicional específico; o inaceitável (pelo menos deveria ser assim) é fazer do “ministério musical” um grande negócio de enriquecimento e fama. Cantar das graças de Deus, não pode ser de graça porque há ônus, mas não deveria ser feito como forma de explorar os crentes. Me admiro de pastores que patrocinam esses cantores ao pagar-lhes altos cachês, ao passo que negligenciam o financiamento de trabalhos evangelísticos, sociais e missionários; isso é absurdo!
Gravar CD para não poder cantar o que o Espírito inspira; não poder ir a igrejas menores por conta de cachês extravagantes; não poder falar com os irmãos a não ser por meio de assessoria é um modelo de “ministério” dissecado pela secularização e inflamado pela exploração do mercado cristão. Se muitos de nossos irmãos inocentes soubessem como o esquema comercial funciona talvez nem comprassem essas produções musicais que parecem fazer bem à alma ao mesmo tempo que enriquecem seus intérpretes e produtores. Entendo que cantar e não ter voz própria por tê-la vendido junto com a alma a um sistema voraz de comércio é fugir do chamado e renunciar ao propósito do dom recebido de graça para louvar e engrandecer a Deus!