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“Traseiros” ou pontapés? O significado da abertura da copa.

O texto a seguir é do irmão Dilson Cunha. Estou muito longe e não pude acompanhar a festa de abertura. Aqui na cidade da fronteira, no entanto, alguns sírios e jordanianos vestiam a camisa do seu time favorito: Brasil! É emocionante.

Uma enxurrada de comentários e críticas à abertura da copa me deixaram curiosa. Porém, este texto foi o mais completo na descrição da festa. O que afinal aconteceu  na abertura desta copa? Leia a seguir:

Talvez você não tenha percebido, mas ocorreu algo de relevante peso simbólico na “abertura de jogos escolares do ensino fundamental” da Copa das Copas.

De um lado, a demonstração de anos de pesquisa do neurocientista brasileiro, quase Nobel, Miguel Nicolelis, em que um paraplégico que, numa veste robótica que capta atividades cerebrais e a transforma em movimentos, deu um pontapé numa bola. Sim, um milagre da ciência jogado a escanteio e que passou despercebido. Um pequeno pontapé para um homem, mas – quem sabe – um salto para os paraplégicos. A Fifa impediu que a demonstração fosse no gramado, no centro do campo, por causa do gramado. 

De outro, duas bundas latinas rebolantes que, à revelia da neurociência, também mostraram o que se pode fazer a partir de atividades neurais com esqueleto flexível, fartos glúteos e um playback. Aliás, dispensam qualquer ciência. Essas bundas rebolantes ganharam o centro do campo, os ‘holofotes’ e os aplausos da torcida neurocientificamente alienada, mas empolgada. Aplausos também são expressões de atividades neurais.

Que contraste! Fico pensando no que pensaram os colegas e alunos do Nicolelis, que pesquisa e leciona na Universidade de Duke, nos EUA, há vinte anos.

O dia em que dermos um pontapé nos nossos glúteos rebolantes e os mandarmos para escanteio, talvez o cérebro ganhe alguma relevância e primazia nos nossos campos. Por enquanto, nessas bandas onde abundam bundas, qualquer bundada continua a ser um desbunde para os bundões cultural e cerebralmente moribundos.

Quem sabe na próxima Copa no Brasil, quiçá no século 22, essa geração bunda-mole, já não estando mais aqui, seja apenas uma vaga lembrança e talvez o Nicolelis seja reconhecido como precursor de um milagre que lá, naquele distante século, terá feito do milagre de um paraplégico andar uma coisa tão comum que lá então, e só lá então, alguns jogadores poderão ser craques com um histórico de ex-paraplégicos. Aí já teremos canonizado São Miguel.

Por enquanto, Nicolelis, a inteligência não nos excita. Por aqui, são outros estímulos neurais que fazem – e levantam – nossas cabeças.

Dilson Cunha

12/06/14

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