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Resposta a Janaína Paschoal: o que produz divisão religiosa é a ignorância

Resposta a Janaína Paschoal: o que produz divisão religiosa é a ignorância

Foto: reprodução/Google

Como é possível uma professora de Direito de uma das mais conceituadas universidades da América Latina, a USP, afirmar que Estado laico não é Estado ateu, fazendo também uma crítica à manifestação de fé da primeira-dama do Brasil? Sim, esta proeza foi realizada pela deputada estadual Janaína Paschoal, na terça-feira.

Durante um discurso com direito a choro na Assembleia Legislativa de São Paulo, Janaína se dirigiu a Michelle Bolsonaro, pedindo para que ela “não plante a semente da divisão religiosa” no Brasil. Oi? Onde, como e quando a primeira-dama fez ou falou qualquer coisa neste sentido?

De onde Janaína tirou isso? A imprensa alega que foi de uma publicação feita por Michelle, na qual Lula aparece recebendo uma espécie de “passe” em um ritual religioso de matriz africana. Então, a primeira-dama escreveu: “Isso pode, né! Eu falar de Deus, não!”

O ‘ABC’ do Estado laico

Já na quarta-feira, Janaína Paschoal voltou a fazer uma crítica em alusão à Michelle Bolsonaro. Ela publicou, em suas redes sociais:

“Passei anos ensinando que Estado laico não é Estado ateu. Mas me sinto na obrigação de dizer que Estado Laico também não é Estado Confessional. Para o bem da Democracia, que pressupõe pluralidade, seria bom não misturar tanto Religião com Política”.

Em outras palavras, Janaína insinua que o governo Bolsonaro, através da primeira-dama, estaria querendo fazer do Brasil um “Estado confessional”. Mas, existe algum Projeto de Lei neste sentido? Alguma ação oficial do Presidente da República com o objetivo de favorecer uma religião, em detrimento das outras?

Não há! O que existe são manifestações de fé da primeira-dama, e isto demonstra que Janaína está se baseando na expressão religiosa da esposa do Presidente para acusá-la “respeitosamente”, pasmem… de causar “divisão religiosa” no país!

Janaína, querida, você precisa se decidir: laico, afinal, é o Estado ou os seus cidadãos? Pergunto porque, até onde sei, a laicidade estatal não se aplica a pessoas, mas sim ao Estado, conforme orienta o Artigo 19, incisos I e III da Constituição Federal.

O texto é claro ao dizer que o vínculo de dependência, promoção ou preferência religiosa “é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios”.

Portanto, trata-se de governo e não dos governantes; de gestão e não dos gestores; da máquina pública e não dos seus operadores!

Assim, Michelle Bolsonaro tem plena liberdade de manifestar a sua fé onde quer que esteja, porque ela é uma cidadã e não o Estado! As palavras da primeira-dama, por mais influente que ela seja devido ao título que possui, não são diretrizes governamentais, mas algo pessoal e amparado também pela Constituição, que diz:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”, sendo “inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”, motivo pelo qual “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa”.

Em outras palavras, não é porque Michelle Bolsonaro ocupa o posto de primeira-dama do Brasil que ela possui menos direitos no tocante à manifestação da sua fé. O texto diz que todos são iguais perante a lei, destacando “sem distinção de qualquer natureza”.

Conclusão

A crítica de Janaína Paschoal é lamentável, pois parte de uma visão que despreza a fenomenologia das religiões no tocante ao ensino e pregação. Isso porque, doutrinas diferentes produzem visões diferentes.

Consequentemente, é natural que Deus ou o diabo, anjos e demônios, sejam interpretados de modos diferentes. O que para um é espírito maligno, por exemplo, para outro pode ser a manifestação de um ancestral, ou até mesmo de um inseto em evolução!

Nada disso, porém, caracteriza divisão religiosa no sentido de intolerância, mas tão somente a existência de visões opostas na forma de interpretar fenômenos iguais ou diferentes, sendo esse o motivo da pluralidade religiosa no mundo.

Não respeitar essas diferenças e o direito de pregá-las é o que caracteriza intolerância e divisão, pois alimenta o autoritarismo daqueles que, em nome de um falso moralismo universal, desejam eliminar os que defendem a própria forma de interpretar e vivenciar o sagrado.

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