Durante os nove anos em que dei aula em seminário teológico era muito comum ver alunos fazerem perguntas sobre dificuldades bíblicas como essa. Depois de todo esse tempo, descobri a resposta mais correta que há para essas questões: “Não sei”. Por que Deus cria pessoas que Ele já sabe que vão para o inferno? Não faço a mínima idéia.
Também não sei por que Ele criou Lúcifer se antecipadamente tinha ciência de que ele se rebelaria. Do mesmo modo que não sei por que não lançou logo Satanás no lago de fogo e enxofre em vez de deixá-lo solto, atazanando nossa paz. Não sei por que disse a Adão e Eva para não comerem do fruto se sabia que comeriam. Não sei se Adão tinha umbigo. E não sei por que nos manda orar se já sabe o que vamos pedir. Não sei por que o Senhor deixou tantas coisas sem explicação na Bíblia. Assim como não sei por que Ele permite que passemos por tantos sofrimentos. Não sei os motivos de Deus curar uns e não outros. E não sei para onde vão os bebês que morrem no parto. Não sei como é possível existir um Ser não-criado. Também não sei por que Deus dá tanto valor à fé em vez de aparecer logo para a humanidade e dizer “ei, este sou Eu”. Não sei como Moisés apareceu na transfiguração se os mortos não podem voltar à Terra. Não sei explicar como o Sol parou. Não sei como é possível haver três pessoas e um só Deus. Não sei como os dinossauros entram no relato bíblico. Não sei o que é a marca da Besta nem o exato significado de 666. Não sei como pode toda autoridade ser instituída por Deus e haver Hitler, Mussolini e Pol Pot. Não sei nada. E, acima de tudo, não sei como os homens são tão prepotentes que acham que vão conseguir saber tudo sobre Deus.
Desista, meu irmão, minha irmã. Você vai nascer, viver, virar a Bíblia e livros teológicos do avesso e vai morrer sem saber bilhões de coisas sobre Deus. Não, não vou usar Deuteronômio 29.29 para me justificar, o ponto aqui não é esse. Que Deus tem muitos mistérios não é segredo para ninguém. A questão é como nós, seres medíocres em termos de limitações intelectuais, que usam uma miserabilidade de seus cérebros, queremos entender a mente e as ações de Deus. Quer um conselho? Recoste-se, respire fundo e relaxe: nunca você terá as respostas a essas perguntas.
Às vezes sou obrigado a rir. Vejo pastores-celebridades pregando cada barbaridade em nome de suas “conclusões” sobre Deus. A Teologia Relacional é um exemplo clássico. Imaginada por um confuso pastor assembleiano brasileiro, esse conto da carochinha tenta convencer o povo de que o Deus que é amor permite que tragédias aconteçam porque Ele teria aberto mão de sua soberania no que tange às desgraças. Ai, ai… Prepotência humana de homens querendo ser oniscientes. Qual é o problema em dizer “EU NÃO SEI”? É um resposta digna e humilde de quem se reconhece incapaz de compreender esse Ser incompreensível que é o Criador. Mas não: é preciso buscar uma explicação que satisfaça os brios humanos. E, com isso, o tal pastor presta um desserviço ao Evangelho levando uma multidão de seus fãs (Deus, me explica como um pastor tem fãs? Pois eu não sei…) a crer na heresia das heresias de supor que o Todo-Poderoso Deus abre mão de sua Onipotência e Soberania. “Ah! Mas pelo menos agora temos uma resposta racional!”. E eu perguntaria: e daí?! É preferível carregar dúvidas no coração e confessar-se incapaz de compreender esse Deus incompreensível ou criar mentiras bíblicas que nos façam acreditar que conhecemos o incognoscível?
“Não sei” é uma das respostas mais lindas que há no que se refere às coisas de Deus. Nesse sentido Isaías 55 contém um dos trechos mais belos da Bíblia sobre o tema. Vamos a partir do versículo 7: “Deixe o perverso o seu caminho, o iníquo, os seus pensamentos; converta-se ao Senhor, que se compadecerá dele, e volte-se para o nosso Deus, porque é rico em perdoar. Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos, os meus caminhos, diz o Senhor, porque, assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos, mais altos do que os vossos pensamentos”.
Extraordinário. Veja que lição de humildade podemos tirar desses três versículos. Primeiro, a mente de Deus funciona a uma distância gigantesca da mente humana. Pense na distância entre céus e terra. É muito longe! Pense agora naquilo que você crê sobre o Criador, suas certezas, suas teorias, suas explicações. Trace mentalmente todos os seus pensamentos sobre o Altíssimo. Lamento informar, querido, querida, mas essa passagem deixa claro que tudo o que você supõe em seus pensamentos está absolutamente distante, a anos-luz dos reais pensamentos de Deus. Em outras palavras, o que Deus nos está dizendo é: “Vocês não sabem nada!”.
Eu poderia ter pego apenas os dois últimos versículos dessa passagem, mas vim desde o sete para ilustrar o que estou dizendo. Repare o que diz o texto: “Deixe o perverso o seu caminho, o iníquo, os seus pensamentos; converta-se ao Senhor, que se compadecerá dele, e volte-se para o nosso Deus, porque é rico em perdoar”. O que o Criador está fazendo aqui é nos mostrar como a forma de Ele agir contraria diametralmente a forma como nós agiríamos. Ou seja: seu modo de raciocinar, de lidar com as circunstâncias, de atuar e tomar decisões é muitíssimo diferente da nossa.
Repare: quando julgamos que alguém é perverso e iníquo (ou seja: injusto, mau caráter, cruel, malévolo, malvado), nossa natureza nos leva a querer que a justiça e o castigo venham sobre ele, que pague pelos seus atos, que seja punido, arrebentado, detonado, apedrejado. Muito castigo é pouco para ele, aos nossos olhos. Mas aí chega Deus. Olha para nós. Balança a cabeça. E diz “você não sabe nada. Não é isso o que eu quero”. E o que o Senhor faz? Conduz o canalha ao arrependimento. Se compadece dele. E ricamente o perdoa. Dívida zero. Castigo zero. Punição zero. Quem entende?
Você quer ser um cristão melhor? Então treine repetir essas duas palavras: “Não sei”. Pois no momento em que começar a confessar que não sabe montes de mistérios bíblicos, passará a deixar de lado enigmas que nunca serão respondidos e prestará atenção no que realmente importa: toda a humanidade pecou e destituída está da glória de Deus, mas Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu Filho unigênito para que todo aquele que nele crê não pereça mas tenha a vida eterna e por isso devemos ir e pregar o Evangelho a toda criatura, fazendo discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que Jesus nos ordenou. E tudo isso tendo a maior de todas as certezas: que Cristo está conosco todos os dias, até à consumação do século.
Paz a todos vocês que estão em Cristo,
Maurício Zágari