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A PNPS não é um projeto totalitário

Semelhante ao que ocorreu no período da chamada “Guerra Fria” (1945-1989), em que o governo dos EUA desenvolveu uma verdadeira caça as bruxas, movimentos religiosos do Brasil desenvolvem teorias da conspiração, especulações com base em prenoções típicas do senso comum, e, ao mesmo tempo, instigam o movimento evangélico brasileiro a combater as políticas públicas do governo federal, com a desculpa de que “são parte de um movimento para instalação de uma ditadura socialista”.  A mesma paranoia – e há análises que apontam outras justificativas, ou interesses – foi alardeada pelos EUA, que via comunista até mesmo na sopa de seus cidadãos. Ditaduras foram instaladas na América Latina com o apoio da Casa Branca. Resultado: centenas de civis foram mortos, torturados, agredidos física e psicologicamente por agentes que diziam “combater o mal”, o “inimigo estrangeiro, o comunista”. Puro delírio!

É uma característica comum em movimentos destrutivos à criação de um inimigo, de um perigo que ronda os fieis. Foi assim com o Templo dos Povos, o Ramo Davidiano, a Família Manson, a Família Internacional, que conduziram seus fieis a práticas de rebeldia civil, isolamento em locais distantes da sociedade, da família, do alcance das políticas públicas. Enfim, uma verdadeira histeria é criada com o objetivo de manipular um nicho específico da sociedade. Cria-se um inimigo, reune-se um grupo de soldados e explora-os financeiramente. Nesta guerra contra o mal, contra os comunistas de plantão, perde-se o sentido da ética, recorre-se a Maquiável, suas táticas de controle. Contra políticas públicas, de amparo as camadas sociais espoliadas pelo sistema econômico mundial aliam-se a ditadores, a líderes políticos declaradamente defensores de práticas de tortura, a movimentos neopentecostais que abertamente roubam seus fieis, com campanhas, unções, curas milagrosas.

A histeria propalada pelos extremistas midiáticos, cibernéticos, é a de que a PNPS “é uma estratégia criada com o objetivo de se instalar uma ditadura socialista no Brasil”. O extremista religioso só consegue enxergar preto e branco em tudo. Sua visão, em decorrência de sua vivência fanática e distorcida da sociedade, permanece completamente comprometida na medida em que desenrola sua guerra, seu combate aos inimigos comunistas, socialistas, esquerdistas. Não consegue compreender – ou talvez até consiga, mas precisa impingir outra análise – que a PNPS é na verdade uma reencenação de algo que já existe na sociedade, de participação da população nos rumos do governo, no compartilhar público. Afinal, a democracia não pressupõe liberdade de opnião, de participação? Há diversos conselhos existentes no Brasil, como da saúde, da cultura, da educação, da habitação etc. que possuem significativa importância. Não é o Congresso Nacional o alvo da PNPS, mas a tradicional política brasileira, caracterizada pelo clientelismo, mandonismo, coronelismo que dificulta o crescimento e modernização democrática do Brasil. O governo errou apenas ao não submeter ao Congresso a apreciação do projeto, para torná-lo lei. No mais, o projeto não tem nada de conspiração, de esquerdismo, mas de consolidação da democracia, da participação popular.

Enfim, há inúmeros projetos no Estado de São Paulo que poderiam ser tomados como exemplos de “políticas sociais”, “populistas” e, no entendimento dos extremistas religiosos, “esquerdistas”, a exemplo do Bom Prato, o Programa Dose Certa, o Poupatempo, a CDHU. A notícia da vez – e é provável que os ciberativistas vão criar um verdadeiro alarde – é a escolha de um “esquerdista” e “terrorista” (usando dois pejorativos tomados com frequência por extremistas), para vice na chapa do presidenciável Aécio Neves, Aloysio Nunes, de passado esquerdista, guerrilheiro. Ex-filiado do Partido Comunista Brasileiro (PCB), Nunes foi membro ativo da Aliança Libertadora Nacional (ALN), “maior organização guerrilheira do Brasil naquela época”, segundo Bob Fernandes (Terra Magazine, 30/6/2014). Eis uma ótima receita para um certo ciberativista explorar em sua guerra midiática. Haveria um novo complô socialista via PSDB? O extremismo religioso é de uma sandice pavorosa.

Há uma verdadeira paranoia que têm como base movimentos extremistas, de manipuladores de massa que desenvolve nichos de influência e aufere lucros exorbitantes. A manipulação requer ideias, ideologias, inimigos a serem combatidos. A massa necessita de “emoção”, de “empolgação”. A Forbes declarou, em publicação recente, que uma das “estrelas” do extremismo religioso brasileiro possui milhões em patrimônio. Mesmo que exagerada, a revista norte-americana parece acertar ao mostrar como funciona a manipulação de um nicho, a partir de um tema de amplitude nacional – cria-se um inimigo, organiza-se um nicho de influência e recolhem-se os frutos da sementeira. É a paródia nacional, uma das consequências de um crescimento desordenado e sem fundamentação teológica, histórica, científica. Obviamente que em política não há limites éticos, mas parece de uma contradição pavorosa as alianças supostamente estabelecidas por extremistas religiosos, como a que associa certo deputado federal pelo Rio de Janeiro, militar, como “um exemplo de ética, de honradez pública”. O cara é um torturador declarado, um machista da pior especie. Preocupante!

O Absolutismo Monárquico e a Ditadura Militar foram extintos ao longo da História. É direito de todo cidadão participar das políticas públicas, cobrar, fazer propostas de mudança, opinar. É preciso compreender, de uma vez por todas, que o caminho do crescimento não é à esquerda, nem à direita, mas pelo caminho do meio, da conciliação, da participação popular. O diálogo é a única saída para um crescimento sustentável e duradouro, com democracia, liberdade de expressão, de crença religiosa e respeito ao povo. Em resumo: nem o socialismo, nem o capitalismo são a saída para os problemas de nosso país, mas a união de nossos cidadãos, a mudança de nossa estrutura social. No entanto, alguns parecem querer o retorno ao absolutismo medieval, da França pré-1789.

Que Deus abençoe a Igreja evangélica brasileira e nos livre do extremismo religioso!

 

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