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O papel da mulher

Esses dias tive uma recordação! Um relance de uma música que ouvi muito numa época da minha infância, do sambista Agepê.
Na letra dizia: “quero te pegar no colo, te deitar no solo e te fazer mulher”.
A frase caiu na minha mente direto com uma indagação: “Nossa, do que é feita uma mulher?”
Algumas instituições são tão sagradas neste planeta que demoramos eras para ousar questiona-las.
Uma dessas questões enrijecidas é sobre o papel de cada gênero na sociedade. Aqueles velhos e desbotados clichês de que homens lutam, pegam no pesado pra sustentar a casa, enquanto as mulheres cuidam das crianças, lavam a louça e preparam as refeições parece ainda ter poder sobre a organização das coisas no mundo deste tempo.
Sei que muito já mudou no que tange a aproximação da igualdade entre os sexos e que hoje até temos uma ‘presidenta’ no Brasil, mulheres pilotando ônibus urbanos e lutando MMA profissionalmente. No entanto, acredito que o tema vá mais longe do que isso, invadindo ambientes de grande sutileza nos meandros de nossas mentes.
Nos subúrbios dos pensamentos, nos locais afastados das conversações sociais polidas, ainda estão vivos conceitos sobre papeis que transformam homens e mulheres em personagens pre estabelecidos, como o da letra da canção acima citada que traduz o conceito: ‘eu, macho, vou deitar você e faze-la fêmea’, transformando um ato natural num tratado que convenciona como homens de verdade devem agir e como mulheres de verdade devem se deixar guiar.
Conceitos morais antigos, tradições de pais pra filhos, catecismos religiosos são perpetuados em nosso imaginário, formando blocos sedimentados de pensamento.
Muitos de meus amigos cristãos creem ser inconcebível que uma mulher seja pastora e para isto utilizam de máximas paulinas completamente culturais e preconceituadas de que mulheres devem aprender com seus maridos em casa e na igreja ficar caladas.
Ridículo manter uma regra dessas nos dias atuais!
Somente pessoas extremamente fundamentalistas e dominadas por leituras literais podem fazer disso código de conduta social.
Acordem! Os melhores, mais apaixonados e capazes obreiros de todas as igrejas onde servi eram mulheres.
Me dirijo aos irmãos cristãos porque estamos entre os mais influentes segmentos da sociedade brasileira, com nossas regras de conduta moral passadas de pai pra filho.
Ora, se por outro lado está escrito que: “não há macho ou fêmea, pois todos são um em Cristo”, o conceito de gênero caiu por terra ainda em tempos bíblicos, mas não tivemos condições de, como igreja, transformar essa igualdade em algo real e por quê?
Por causa da necessidade de termos sempre pessoas subservientes, alguns para comandar e não há nada tão eficiente pra destacarmos elites sociais do que uma tradição religiosa.
As mulheres são a mais antiga subclasse social do mundo e, embora a própria ‘lenda da criação’ constar seu caráter igualitário, em relação ao homem, todas as interpretações daquela metáfora colocam o homem na primazia e a mulher como secundária, perpetrando a injusta condição desde sua concepção no projeto divino; ou seja, dando caráter de ‘lei de deus’ a um conceito mesquinho e, pior, de manipulação social.

Sei o quão dura é a tarefa de se posicionar “contra” a Escritura, mas minha ideia não é essa, embora acredite que a maioria dos leitores assim interpretarão minha reflexão. No entanto, minha ideia é a de fazer novas leituras, evoluir, respeitar, ir além.
Devemos deixar de ser “os mesmos e viver como nossos pais”, parafraseando Belchior e partir no rumo da transformação, através da renovação de nossas ideias, parafraseando Paulo de Tarso, a fim de construir uma nova sociedade, baseada no respeito, no amor, na justiça, na equidade, pois “o que define uma pessoa não é o que há entre suas pernas, mas o que carrega entre suas orelhas”.

Trago hoje estas palavras para que não incorramos – ou tenhamos co-resposabilidade – nos erros de um machismo institucionalizado que justifica atos de violência, como os de judeus que queriam apedrejar a mulher adúltera diante de Jesus, ou do jovem brasileiro que espancou quase até a morte um rapaz gay dizendo a simbólica e chocante frase: “se você quer ser uma mulher, então vai apanhar que nem uma mulher”.

Reflitamos!

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