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Ladainhas e lengalengas do carrossel gospel

De vez em quando pinta algum irmão falando sobre aqueles assuntos padronizados e batidos. Aqueles que mais se parecem com um carrossel de pensamentos, onde as coisas sempre voltam para nós, de tempo em tempo, como uma ladainha.

Aliás, você sabe o que é uma ladainha?

A ladainha é uma reza litúrgica cheia de repetições, perguntas e respostas, aquelas orações que mais comumente vemos nas igrejas católicas, onde o padre fala algumas frases monotonais e o povo em uníssono responde algo como “Rogai por nós” e “Amém”.

As ladainhas foram instituídas para ensinar o povo, um método de fixação doutrinária e sua prática se tornou altamente popular tendo em vista seu caráter místico e o aparente poder de conduzir as pessoas a estados de quietude, resignação e arrependimento contrito. Quase um mantra!

Mas as ladainhas gospel da atualidade não têm esse caráter espiritual, pelo contrário, elas são quase sempre ligadas a fundamentalismos teológicos, sofismas carregados de aparente espiritualidade, decência e justiça, mas que não passam de mentiras muito bem contadas.

Entre as ladainhas gospel figura o tema da cobertura espiritual. Por mais que se debata sobre esse assunto, ele nunca chega ao fim e parece nunca haver modos de se haver consenso entre as partes pensantes. Uns dizem: “querido, você não pode andar sozinho neste mundo tenebroso, pois Satanás anda ao redor, procurando alguma peça solta do jogo para tragar…”, ou “você sabe que uma brasa isolada, longe das demais, se apaga logo…” “bi bi bi e bó bó bó”.

Dias desses escrevi que Jesus teria dito: “não chamem ninguém de mestre, nem de líder ou de pai”. Muitos não concordam comigo; até consigo entender que não concordem, mas foi o Jesus da Bíblia quem disse isso, então… sei lá!

Paulo também deixou registrado “diz que todo homem que ora ou profetiza tendo a cabeça coberta, desonra a própria cabeça”. Se for pra fazer um ‘revelamento livre’ sobre este texto, eu o faria da seguinte maneira: Quem diz que tem alguma pessoa como cobertura espiritual sobre si, está desonrando a própria cabeça, ou o Cabeça de todo Corpo, Jesus!

Mas a ladainha não se limita a esse assunto. Tem a doutrina do dízimo que, se você não dá, fica sujeito à ação de gafanhotos, o migrador, o devorador e o destruidor. Esses seres mitológicos, tais como criaturas bizarras são enviadas pelas forças tenebrosas para assolar a vida financeira de crentes infiéis, como um instrumento de tortura que Deus estabeleceu para surrar aqueles que não pagam suas taxas mensais.

Jesus, que pai cruel!

Outra? “Irmão o pecado poderá gerar uma brecha em sua vida, uma legalidade por onde o diabo irá entrar e criar uma fortaleza dentro de você, aprisionando-o com amarras espirituais”. Bem daí, danou-se total, né?!

Quanto mais gospelizados ficamos, mais nos aprofundamos em conhecimentos que ao invés de nos libertar, nos tornam ainda mais amedrontados e reprimidos.

Não duvido da existência de ‘situações de risco’ para os crentes, mas uma coisa que não sai da minha cabeça são as palavras do Senhor, dizendo que fomos chamados à liberdade, que é fruto do conhecimento da Verdade. Daí, sou rebatido com outro clichê muito utilizado pela turma do deixa disso que é o “você pode fazer tudo, amado, mas nem tudo convêm”.

Acredito na absoluta e definitiva ação da Palavra de Deus sobre nossas vidas, no entanto, não acredito na absoluta e definitiva uniformidade dessa Palavra. Não consigo mais cair nessas conversas sem base sólida firme que, de tanto serem repetidas, acabaram se tornando em verdades irrestritas no imaginário dos crentes.

Goebbels, marketeiro de Hitler, teria dito que “uma mentira dita mil vezes torna-se verdade”. Sofismas rimados, repetidos, cantarolados, declamados, como cantigas de roda e lengalengas não colam mais pra mim. Quando ouço ligo stand by da mesma forma que faço quando uma vendedora automatizada de empresa de telefonia ou cartão de crédito me liga, tentando me convencer com seu discurso decorado a adquirir um produto.

Minha sugestão é que cada pessoa deve pensar por si, fazendo sua própria avaliação da Bíblia, conferindo sempre com outras pessoas, debatendo, aprendendo e ensinando, pois sabemos que nada na Escritura está resumido à particular interpretação.

Entre escolher ficar com os achismos dos outros e o seu, qual você escolheria? Eu prefiro sempre os meus, pois entendo que Deus fala comigo também – a não ser que seja cabalmente convencido pela lógica de outros (o que acontece corriqueiramente).

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