Colunas

Discriminação, preconceito, futebol…

Detonar todo um povo, todo um estado, por causa da atitude de alguns é tanta discriminação quanto… prestem atenção, antes de detonar todos os gaúchos, dizendo que são neo nazistas, por causa do momento infeliz da menina do jogo (infeliz pq perdeu, infeliz pq falou bobagem etc).
A mim parece que estão fazendo a mesma coisa, no mesmo momento, o que não passa da mais pura hipocrisia, demonstrando cegueira proposital, tolice antropológica e infecção da doença do ciber-oportunismo (que é essa mania que linchamento virtual, que coloca todos juntos na mesma condição dos inquisidores, que queimavam nas fogueiras em praças públicas, as pessoas que faziam o que a ortodoxia condenava).

Prestem mais atenção!

Abaixo, deixo a cópia do texto escrito por Lupicínio Rodrigues, notável compositor gaúcho, gremista e afro descendente:

“Domingo, estive em um churrasco na Sociedade Satélite Prontidão, onde se reúne a ‘gema’ dos mulatos de porto Alegre. Lá houve tudo de bom, bom churrasco, boa música e boa palestra. Mas como nestas festas nunca falta uma discussão quando a cerveja sobe, lá também houve uma, e foi a seguinte:
Uma turma de amigos quis saber por que, sendo eu um homem do povo e de origem humilde, sou um torcedor tão fanático do Grêmio.

Por sorte lá estava também o senhor Orlando Ferreira da Silva, velho funcionário da Biblioteca Pública, que me ajudou a explicar o que meu pai já havia me contado. Em 1907, uma turma de mulatinhos, que naquela época já sonhava com a evolução das pessoas de cor, resolveu formar um time de futebol. Entre estes mulatinhos estava o senhor Júlio Silveira, pai do nosso querido Antoninho Onofre da Silveira, o senhor Francisco Rodrigues, meu querido pai, o senhor Otacílio Conceição, pai do nosso amigo Marceli Conceição, o senhor Orlando Ferreira da Silva, o senhor José Gomes e outros. O time foi formado. Deram o nome de Rio-Grandense, e ficou sob a presidência do saudoso Julio Silveira. Foram grandes os trabalhos para escolher as cores, o fardamento, fazer estatutos e tudo que fosse necessário para um clube se legalizar, pois os mulatinhos sonhavam em participar da Liga, que era, naquele tempo, formada pelo Fuss-Ball, que é o Grêmio de hoje, o Ruy Barbosa, o Internacional e outros.

Este sonho durou anos, mas no dia em que o Rio-Grandense pediu inscrição na Liga, não foi aceito por que justamente o Internacional, que havia sido criado pelo ‘Zé Povo’, votou contra, e o Rio-Grandense não foi aceito. Isso magoou profundamente os mulatinhos, que resolveram torcer contra o Internacional, e o Grêmio, sendo seu maior rival, foi escolhido para tal.

Fundou-se, por isso, uma nova Liga, que mais tarde foi chamada de Canela Preta, e quando estes moços casaram, procuraram desviar os seus filhos do clube que hoje é chamado o ‘Clube do Povo’, apesar de não ter sido ele o primeiro a modificar seus estatutos, para aceitar pessoas de cor, pois esta iniciativa coube ao Esporte Clube Americano, e vou explicar como:

A Liga dos Canela Preta durou muitos anos, até quando o Esporte Clube Ruy Barbosa, precisando de dinheiro, desafiou os pretinhos para uma partida amistosa, que foi vencida pelos desafiados, ou seja, os pretinhos. O segundo adversário dos moços de cor foi o Grêmio, que jogou com o título de ‘Escrete Branco’. Isso despertou a atenção dos outros clubes que viram nos Canelas Pretas um grande celeiro de jogadores e trataram de mudar seus estatutos para aceitarem os mesmos em suas fileiras, conseguindo levar assim os melhores jogadores, e a Liga teve que terminar.

O Grêmio foi o último time a aceitar a raça, porque em seus estatutos constava uma cláusula que dizia que ele perderia seu campo, doado por uns alemães, caso aceitasse pessoas de cor em seus quadros. Felizmente essa cláusula já foi abolida, e hoje tenho a honra de ser sócio-honorário do Grêmio e ter composto seu hino.

Lupicínio Rodrigues

Sair da versão mobile