É interessante como falar de religião para algumas pessoas durante uma discussão política é como cutucar um vespeiro. Basta citar alguns princípios da Bíblia, por exemplo, que rapidamente o outro lado grita aos quatro ventos: “O Estado é laico”. Desse contexto, surge a pergunta: o Estado é laico, mas sou cristão. Como lidar com a fé na vida pública?
A verdade é que a grande maioria das pessoas não entende o que significa Estado laico. É comum encontrar discussões nas ruas e principalmente na internet, onde alguns confundem a noção de poder atribuído ao Governo para impor uma religião ou restringir a liberdade de culto.
Para os cristãos, como eu, que atuam na vida pública ou pretendem se candidatar a cargos políticos, explicar como é possível conciliar os próprios valores religiosos com a existência de um Estado laico nem sempre é algo simples, mas é o que pretendo tentar fazer no texto de hoje.
Estado laico
O Estado laico é um conceito desenvolvido a partir da Reforma Protestante, com a intenção de tornar o Estado neutro com relação às religiões de um país. Ou seja, não interferir nos assuntos religiosos, favorecendo ou prejudicando a liberdade de crença das pessoas. Isso não significa que o Estado não possa se envolver em algumas questões, como no auxílio aos eventos públicos organizados por igrejas, por exemplo, como a Marcha para Jesus ou a Jornada Mundial da Juventude.
O que deve ser compreendido nessa questão é que os incentivos não podem ser negados, por exemplo, para outras religiões, já que em um Estado laico não pode haver o favorecimento de nenhum segmento religioso. Vale dizer que o motivo pelo qual vemos iniciativas do Estado mais voltadas para eventos cristãos em nosso país, é simplesmente porque o Brasil possui maioria cristã e uma cultura profundamente atrelada ao cristianismo, o que explica a enorme quantidade de feriados religiosos.
Estado ateu
Nesse modelo de Estado, que historicamente está mais próximo dos países comandados pelo regime comunista, como a China, Cuba e a Coreia do Norte, as religiões são evitadas, para não dizer combatidas e perseguidas. Há um conjunto de ações que partem dos agentes do Estado, visando à restrição da liberdade de culto.
Como é difícil controlar a população e o sentimento religioso humano, natural em todas as partes do mundo, os governantes reconhecem a existência de práticas religiosas e alguns tentam “regulamentar”, mas a grande maioria é considerada clandestina.
Portanto, para deixar claro, diferentemente do Estado laico, o Estado ateu não é neutro nos assuntos religiosos da população. Pelo contrário, ele interfere sobre os direitos e deveres, querendo determinar o que pode ou não ser aceito como crença religiosa.
Como um cristão pode conciliar seus valores em um Estado laico?
Por ser pré-candidata ao cargo de deputada federal esse ano, pelo Paraná, frequentemente sou questionada sobre como poderei atuar em um Estado laico sem abrir mão dos valores da minha fé, caso seja eleita. Escrevi um artigo recente, intitulado “Cristão que ocupa cargo político tem o dever de representar os valores de Cristo”. Nele escrevi o seguinte:
“Representatividade política é a soma de tudo o que um determinado político acredita. Quando o eleitor vota em um candidato, ele faz isso porque sabe quais são os valores, crenças e visão de mundo que o candidato defende”.
Entender o conceito de representatividade é a grande questão. O Estado laico, como disse antes, não é contra a manifestação das crenças. Quando um político é eleito democraticamente, ele está representando não apenas seus valores, como de todos os eleitores que votaram nele. A garantia do Estado laico está exatamente na possibilidade de vários políticos diferentes representarem crenças diferentes, cada qual com sua visão de mundo, incluindo os ateus, que dizem não professar religião alguma. Isso é democracia.
Político cristão não deve confundir Estado laico com postura laica
Entendido o conceito acima, é fácil perceber que alguns políticos que se dizem cristãos abrem mão dos valores de Cristo para se adequarem ao discurso politicamente correto de “Estado laico”. Eles simplesmente preferem, por exemplo, em temas como o aborto, descriminalização das drogas, “casamento gay”, eutanásia e outros, abrir mão da responsabilidade de se posicionar conforme o que acreditam para defender o “Estado laico”.
Meus queridos irmãos, líderes políticos, quem é laico é o Estado e não você. Se você cristão está ocupando um cargo cujo dever é representar o povo que o elegeu, democraticamente, você tem o dever de assumir seus valores e defendê-los com unhas e dentes. Deixe para quem pensa diferente de você fazer o papel contrário. É para isso que existe a democracia, para haver oposição, e acredite, haverá muita!
Portanto, se um cristão chega ao poder, deve fazer jus ao que acreditamos e em nome daqueles que se diz representante. Ou será que não teremos a coragem suficiente para dizer que mais convém agradar a Deus do que aos homens?