Que diremos, pois? Permaneceremos no pecado, para que a graça abunde? De modo nenhum. Nós, que estamos mortos para o pecado, como viveremos ainda nele? (Rm 6.1,2).
Aparentando ser uma descoberta teológica moderna e uma visão bíblica libertária para o cristão do século XXI, vem o infiltrado movimento da hipergraça propondo-nos mais uma aparente novidade heterodoxa para a igreja. Os ensinamentos e mensagens dos mestres e arautos aderentes a essa disfunção teológica baseiam-se em uma visão de que Deus não pune ninguém. Provavelmente influenciados pela exigência para que as pessoas sejam “politicamente corretas”, muitos de seus ensinamentos confrontam diretamente a Bíblia. O teologismo forjado por esse movimento interpretativo da graça do Novo Testamento propõe ao cristão um estilo de vida que contraria a própria doutrina da graça (Ef 2.8; Rm 6.1-2; 1 Co 15.10; Tt 2.10) e corrompe o sentido da liberdade cristã (Gl 5.13; 1 Co 8.9) além de tentar revogar a renúncia e a abnegação pertinentes aos que se dispõem em seguir a Cristo (Mt 16.24).
É importante esclarecer que hipergraça nada tem de novo; na verdade trata-se do antigo equívoco teológico conhecido na história da igreja como antinomianismo (em grego, anti significa “contra” e nomos, “lei”). Trata-se (o antinomianismo) da crença que a lei moral do Antigo Testamento foi totalmente abolida. Como vivemos depois da vinda de Cristo, afirmam eles que podemos viver do jeito que queremos, pois já não estamos debaixo da Lei, mas debaixo da graça. Assim, restam-nos ler o Antigo Testamento apenas como metáforas, tipos e símbolos sobre a vinda de Cristo. O Novo Testamento acaba com a Lei do Antigo Testamento, por isso tudo é graça, segundo a hipergraça!
As idéias da super, mega, ultra graça até parecem verdades, mas são mortais em sua fundamentação e proposta e potencialmente tão fatais quanto um rótulo de vitamina em frasco de veneno fulminante. Para os teólogos e pastores que estão alertando sobre esse movimento de libertinagem como proposta disfarçada de liberdade cristã, o movimento pode colocar em risco o futuro do cristianismo e enganar milhares de pessoas. Obviamente os líderes que integram esse movimento não admitirão que pertençam a ele. Afinal, não se trata de um movimento organizado, mas sua existência e influência têm crescido através de uma nova consciência cristã secularizada que enfatiza o sucesso pessoal e eclesiástico.
Compartilho observações levantadas pelo teólogo Joseph Mattera. Ele enfatiza que esses sinais descrevem igrejas e crentes que vivem sob a nova interpretação da hipergraça. Como têm sido as pregações e mensagens de sua igreja?
Aproveitei para incluir uns textos bíblicos na abordagem teológica de Joseph:
Os pregadores nunca falam contra o pecado. Se você estiver em uma igreja como esta, irá notar que a palavra “pecado” normalmente só é mencionada no contexto do perdão dos pecados em Cristo. Por vezes, recriminam-se as pessoas que ousam insistir no assunto, classificando-as de “legalistas” e “fariseus” (Ef 4.25; Jo 3.20-21; 2 Tm 4.3).
O pastor nunca toma uma posição firme sobre a santidade. Na tentativa de atrair mais pessoas, tudo é feito para tornar os cultos mais agradáveis, em especial o sermão. Os ministros não tomam posição pública, nem ensinam os membros, sobre questões que estão na ordem do dia como aborto, homossexualidade, legalização das drogas, ou qualquer coisa que possa confrontar o público presente. Ignoram-se quaisquer tentativas de se estabelecerem ou cobrarem dos membros os parâmetros para uma vida de santidade (1 Ts 4.4,7; Hb 12.14; 2 Co 7.1; Jo 17.17).
O Antigo Testamento é quase totalmente ignorado (2 Tm 3.16). Nessas igrejas, o Antigo Testamento é tratado como um registro que não tem valor real com nosso estilo de vida moderno. Convenientemente, não se menciona os Dez Mandamentos nem as porções bíblicas onde Deus é mostrado como juiz (Ex 20.3-17; Sl 50.6; 75.7; 2 Tm 4.8).
Os líderes são autorizados a ensinar e pregar mesmo vivendo abertamente em pecado. Se não há mais condenação, pecados como imoralidade sexual, ganância e embriaguez são tolerados (2 Tm 3.1-7; Ap 2.14, 20, 21). Seja para membros comuns ou pessoas em posição de liderança, isso não é “importante”, pois não refletiria o amor ao próximo e respeito pelas suas escolhas (Pv 28.13; Hb 10.26-27; Lc 13.26-28).
As mensagens muitas vezes se voltam contra a igreja institucional. Os pastores que adotaram a hipergraça constantemente se voltam contra as igrejas mais “conservadoras”, pois acreditam que sua mensagem não é mais relevante para a cultura de hoje (1 Tm 3.15; Hb 10.25). Além disso, eles dizem que esses “fundamentalistas” apenas colaboram para que as pessoas em geral tenham uma má impressão dos evangélicos.
Os pastores pregam contra contribuições. A hipergraça não estimula as pessoas a lerem a Bíblia e chegarem às suas próprias conclusões, mas se preocupa em dizer no que elas não podem acreditar. Embora falem sobre ofertas e anunciem às necessidades financeiras da igreja, os pastores defendem que o dízimo é mais uma lei que foi abolida em Cristo. Portanto, cada membro pode decidir se deseja ou não se envolver financeiramente (Ml 3.10; Lc 11.42; 2 Co 9).
Os pastores pregam apenas mensagens motivacionais positivas. Dos púlpitos dessas igrejas ecoam apenas mensagens positivas sobre saúde, riqueza, prosperidade, o amor de Deus, o perdão de Deus e como se obter sucesso na vida (2 Tm 4.3). Não há preocupação nem interesse de se anunciar “todo o conselho de Deus” (At 20.27), nem estimular trabalhos evangelísticos ou missionários que exijam arrependimento e mudança de vida (2 Co 5.17; Cl 3.8; Ef 4.22). Não se menciona a existência do diabo ou de seus anjos. Deus ama a todos e cuida para que nenhum mal chegue perto deles.
Os membros da igreja não precisam temer nenhum tipo de reprimenda da liderança. Os participantes de uma igreja da hipergraça serão convencidos que, por causa da forte ênfase na graça, tudo é permitido. Ou seja, nenhuma mudança real se espera deles, apenas que freqüentem os cultos e sejam “pessoas melhores e mais felizes” (1 Co 10.32; At 20.28).
Concluo, alertando que é preciso analisar o conteúdo das mensagens que estamos ouvindo; dos livros e literaturas ditas cristãs que estamos apreciando; das músicas que escutamos e até os testemunhos que nos são contados. Hipergraça é um movimento de expressões e idéias supostamente teológicas e com embustes de fundamentação bíblica – ela existe como um racionalismo liberal com roupas cristãs, convenientes ao homem da pós-modernidade. Desta forma qualquer igreja evangélica, pode sem querer ou perceber fornecer seus púlpitos como palanque para a exposição da falsa teologia dos proponentes hipergracistas. Que tenhamos esclarecimento bíblico e discernimento espiritual (Fp 3.2).