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Abro mão!

“Não aceito entrar em guerras compradas por interesses que desconheço, acordos impublicáveis, agendas secretas, ambiciosas, descomprometidas com a verdade que tanto alardeiam enquanto mobilizam massas com meias verdades, criando monstros a serem combatidos, organizando marchas, protestos, mobilizações que fomentam ódio em nome do amor, ataques em nome da salvação, perseguições em nome do combate ao pecado.”

Admito minha completa incapacidade em desvendar os mistérios, as nuances, as subliminaridades que abriga o coração humano. Sei que minha percepção está absolutamente condicionada a minha cultura, meus valores, meu tempo, portanto, quem sou eu para apontar o dedo e condenar? Abro mão de qualquer direito que porventura me de a sensação de que posso diminuir outro humano, rotulando-o por sua religião, ideias, comportamento sexual ou seja lá o que for.

Não! Não quero combater pecados nos outros. Talvez você seja mais hábil do que eu, mais santo, mais espiritualizado, mais gabaritado, maior, mais forte e sábio, no entanto, quando olho para meus próprios pecados, estranhamente, sinto que são suficientes, que preciso andar sob a luz para que não se escondam atrás de argumentos sutis, ou, sobretudo, que, ao invés de me enxergar, adote a confortável postura de apontar no outro o que recuso a tratar em mim.

É mais fácil gritar “herege!”, rotular “pecador”, ser paladino defensor da moral, família e bons costumes do que admitir que, enquanto acuso o outro, me condeno, enquanto penso apontar desvios de quem quer que seja, revelo os meus, os labirintos, as vergonhas, as contradições tão arraigadas na minha própria interioridade e disfarçadas na típica postura de quem se coloca como “defensor da fé”, acusador de plantão, referência de moralidade ou fé cristã. Abro mão do mais sútil e diabólico sentimento de superioridade, como se coubesse a mim dizer o que é certo ou errado, usando a bíblia, distorcendo-a como quem adere a slogans evangélicos, agindo como quem se esqueceu que, sem amor, nada se aproveita. Nada!

Não aceito tratar como inimigos quem quer que pense ou viva diferente de mim ou do meu grupo. Não aceito entrar em guerras compradas por interesses que desconheço, gente com acordos impublicáveis, agendas secretas, ambiciosas, descomprometidas com a verdade que tanto alardeiam enquanto mobilizam massas com meias verdades, criando monstros a serem combatidos, organizando marchas, protestos, mobilizações que fomentam ódio em nome do amor, ataques em nome da salvação, perseguições em nome do combate ao pecado. Me recuso a caminhar com esses, abro mão de qualquer identificação.

Renuncio a qualquer guerra que tenha sido compulsoriamente incluído, a qualquer sentimento que porventura me engaje em cruzadas raivosas, em compromissos estatísticos, em adesão a batalhas que, apesar dos argumentos aparentemente bíblicos, sigam na contramão do essencial: o amor.

Sendo assim, só me resta o amor. Se quiser combater os pecados do mundo, contabilizar as almas condenadas, ser juiz dos corações, vá, mas não me inclua. Abro mão dessa condição e me exponho ao seu juízo admitindo minha total incapacidade de sondar o coração alheio, minhas próprias contradições e tratando-as consciente de que já é uma tarefa e tanto, suficiente para uma vida inteira.

Quanto ao próximo, ainda que não se pareça com os meus, ainda que contradiga tudo o que acredito, ainda que seja completamente diferente do que eu gostaria que fosse, não me resta mais nada, a não ser amá-lo, respeitá-lo e servi-lo.

Não cabe a mim condenar quem quer que seja, tampouco promover campanhas e cruzadas contra pecadores. Prefiro ser servo, enxergar-me e simplesmente amar.

Pode ser difícil caminhar na contramão da maioria, ir no contra fluxo dos santos de plantão, mas, sinceramente, sinto que não resta alternativa. Foi assim que meu Mestre, aquele que foi crucificado, ensinou e é por isso que hoje, confesso, abro mão, eu mesmo, de ser salvador da terra e luz do mundo. Contento-me em ser vagalume onde estiver e misericordioso como quem, ao enxergar a si mesmo, percebeu-se sem nenhuma escolha a não ser perdoar no outro às contradições que, antes, percebeu em si mesmo.

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