“Lança o teu pão sobre as águas, porque depois de muitos dias o acharás”.
O versículo de Eclesiastes acima dá uma pincelada no ensinamento acerca da semeadura na existência humana. Ao contrário de como grande parte dos evangélicos da atualidade vem interpretando o tema atualmente, a tal “Lei da Semeadura”, que sob os auspícios da teologia da prosperidade tornou-se parecida com uma espécie de teologia gospel kármica, por suas características de ação e efeito, não é tão lógica, líquida e certa, como consideramos em nossas mentes capitalistas.
É curioso ver um pensamento tão pagão adentrando facilmente nas teologias, doutrinas e ritos evangélicos.
Somos filhos da Graça, salvos por ela e obtivemos a abertura das portas do céu através de algo que nunca seríamos capazes de fazer. Outro fez em nosso lugar! Jesus, o Filho de Deus veio ao mundo e realizou em si próprio toda a obra vicária, substituindo cada pecador arrependido em sua cruz pessoal.
Esta é a expiação, o ato do Cristo de morrer em lugar de todos os culpados, promovendo salvação aos verdadeiros pecadores. Isto é a Graça, um dom de Deus, pelo qual ninguém pode pagar, pois tudo foi comprado, não com dinheiro, mas com sangue genuinamente inocente!
Esta é uma doutrina cristã basilar, que afirma a substituição como veículo exclusivo da bênção divina para cada filho renascido. Portanto, não há nada que a pessoa possa fazer, de si própria, para receber essa dádiva.
Acreditar que os bons atos produzem boas recompensas dentro desta existência, ou no porvir; assim como que os maus atos produzem punições aqui e no além é acreditar numa doutrina de causa e efeito, karma e dharma, as quais, apesar de possuírem certa lógica e estar permeadas em pensamentos de justiça, não são nada evangélicas, não são cristãs em sua essência.
Quando o sábio escritor de Eclesiastes diz: “lança o teu pão sobre as águas, que depois de muito tempo ele voltará para você”, ele está dando uma lição de vida. No versículo da sequência diz: “Reparte com sete, e ainda até com oito, porque não sabes que mal haverá sobre a terra”.
Em seu pensamento, não estava o ato interesseiro de fazer algo esperando um pagamento em troca, mas sim o simples ato de semear o bem.
Ora, fazer o bem, amar, repartir e praticar a caridade são ações naturais na vida do generoso, do caridoso, do amoroso, frutos que se manifestam em pessoas boas.
Um cristão, tecnicamente, é alguém que nasceu de novo, que recebeu uma nova disposição mental e um novo coração. Ao cristão deveria ser corriqueiro agir de forma despretensiosa, com generosidade, pelo simples e puro amor ao próximo. Foi assim que Jesus fez e é assim que o Universo espera que seja feito por seus ‘descendentes’ – discípulos.
Um princípio cósmico que é comum em praticamente todas as religiões é a chamada Regra de Ouro do Cristianismo. A frase de Jesus: “tudo o que vocês quiserem que os homens lhes façam, façam também vocês a eles, porque esta é a lei e os profetas”.
Aqui não está escrito que se você fizer o bem receberá o bem de volta. Não é uma troca, não é um investimento, não é negócio, não é karma. É a materialização de sua nova natureza em ações concretas, baseadas na mais altaneira espécie de justiça, a do céu.
“Fazer o bem sem ver a quem”, como diz o clichê, é a natureza de Cristo agindo em nós. Esperar pelo pagamento de boas ações, contribuir financeiramente na esperança do lucro, enfim, agir de forma interesseira são coisas que não expressam o caráter de Cristo ao mundo, pelo contrário, demonstram a pequeneza e a limitação carnal de nossa visão pouco espiritual acerca da experiência terrenal.